Noutro tempo, em prol de um amor impossível, o seu corpo deixou de lhe pertencer. Era linda e graciosa, pequena e o seu jeito alegre e sedutor não era indiferente a ninguém que pusesse os olhos nela. Achavam que ela enfeitiçava os homens. Adornada, prendia-lhes os olhares!
O seu pai tirano, prometera-a contra sua vontade por dinheiro a um malvado e avarento conde que os expropriara de suas terras, em troca, a beleza de sua filha selaria o pacto.
Numa noite de Outono quente, durante um passeio fugidio pelo bosque, junto a um lindo lago, seu amado secreto, um lindo cavaleiro, “ também ele prometido desde que nascera, por imposição e tradição familiar, a uma mulher amarga e má que não sabia o que era amar”, procura-a pelo odor, tentando separar as essências e encontrando-a por entre todas. O desejo que sentem um pelo outro cega-os, os olhares invejosos deixam-nos indefesos. O tirano segue-lhes o rasto por despeito, a mulher que tem como sua, rejeita-o como homem. Em sua companhia, o mal veste a pele de dama, incorpora a distinta presunçosa e ignorada futura mulher do belo cavaleiro, que de tanta inveja da beleza da donzela e ciúme do amor que nutriam um pelo outro lhes lança um feitiço, prendendo-os para sempre entre o bosque e o lago, num labirinto, sendo o feitiço quebrado se conseguirem do mesmo sair os dois.
Presos a um corpo imóvel durante o dia, durante a noite submersos numa contradita luta entre o medo e o amor, que seu corpo mutante separa. Ele segue-lhe o rasto, procura-a pelo cheiro, que conhece tão bem, …segue a sua essência, distingue-a por entre todas as outras. Protege-a dos olhares promíscuos e invejosos. Por vezes o bosque mancha-se de sangue, o seu instinto leva-o a matar, mas a ela nunca lhe faria mal; Ama-a. Nunca a esquecerá! Não da mesma forma que ela, pois não tem consciência humana. Não a deixa libertar-se do feitiço, não a deixa encontrar a saída, pois não a quer perder.
Pequenos seres acompanham-na sempre, seguem-na a todo o lado, também assumem formas mutantes, fazem-lhe companhia e ajudam-na a resolver charadas e enigmas que lhe abrem o caminho do labirinto. Deixam-se vaguear por entre mundos mágicos. Não tem pressa! Anseia libertar-se, mas sem ele não faz sentido, sozinha não pode e tenta encontrar a maneira de o conseguir seduzir até á saída, mas o seu feitiço não o liberta daquele sítio, o único sitio onde ele reconhece o seu cheiro, onde ele a segue e não a perde, fora dali nunca a encontraria.
Assim, todas as noites ela luta por um amor impossível, sonha com o amante pelo qual se perdera de amores, no que os unia, deseja-o, sente-o, vê-o de longe, através dos seus olhos nunca deixara de o ver com o olhar do amor, enquanto ele se esconde de forma predadora, protege-a secretamente, observa-a de longe, sente-lhe o cheiro e mata para a salvar dos olhares.
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